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quarta-feira, 11 de abril de 2007

Na segunda noite

(André Lopes)

A mulher é o anjo expulso do paraíso! Bradava seu Maciel de copo em riste, no boteco do Seu Jadir, crioulo manso e risonho, que sempre dava uma gargalhada após o brado retumbante do Seu Maciel, essa dever ser a oitava ou nona dose de conhaque do Maciel, avisava o crioulo.

Eu gostava de ficar no balcão, jogando conversa fora com seu Jadir, aguardando seu Maciel, na sua velha e surrada calça de tergal marrom, camiseta branca e chapéu de palha. Diziam que ele tinha uma aposentadoria gorda do Banco do Brasil, tinha também, além da aposentadoria, 4 mulheres, 21 filhos, 32 netos e uma mulatinha de 19 anos que aparecia no boteco de vez em quando.

Toda vez que Seu Maciel dizia essa frase, desconsiderava todas as mulheres do mundo e pensava apenas em uma, Quênia, a mulatinha de 19 anos.

Cabelos pretos escorridos nas costas, olhos castanhos grandes e implacáveis, seios redondos e pequenos, dona de uma bundinha redondinha arrebitada, tinha um perfume entre doce e meio ácido que lembrava pitanga e um jeito próprio de rebolar e jogar o cabelo pro lado, tudo isso sempre acompanhado de uma passada rápida e suave de mão sobre eles provocando terremotos nos corações mais embriagados, deixava sempre alguns fios caírem sobre o rosto formando uma cortina transparente acastanhada escondendo parte dos olhos e evidenciando um sorriso fulminante.

Só eu sabia ver a infelicidade daqueles olhos ocultos e aquele sorriso, desenhado pelos lábios grossos e vermelhos de Quênia, a Leca da Avenida Paranaíba, a Paula da Avenida Goiás, a Karla da Avenida Anhanguera, a mulatinha do Seu Maciel, que ele fazia questão de levar, quando podia, debaixo do braço no bar do Seu Jadir.

Nesse dia Seu Maciel estava sem a mulatinha, e quando ele estava sem ela ficava com a garrafa de conhaque, praguejando Quênia e todas as mulheres do mundo, exceto sua mãe, as mães dos seus camaradas eram tratadas pelo velho de vadias pra baixo, menos a sua.

Certa noite Zacarias, ex estivador e ex detento, 23 mortes nas costas, cismou com o porre do Seu Maciel, mas que desgraça esse velho não cala a boca! Calma Zacarias, sorria largo Seu Jadir com os olhos apertados e a mão estendida. Ainda calo a boca desse puto, resmungava Zacarias que ainda não tinha visto Quênia.

Zacarias gostava de pedir ovo cozido e lingüiça frita, colocava tudo de uma vez dentro da boca e engrossava a papa asquerosa com pinga, comia rápido pra poder contar o dinheiro com mais calma, aquela vadia me paga! Zacarias tossia enfezado, levantava resmungando e ia embora sem pagar. No fim de cada mês ele acertava com Seu Jadir.

Na terceira noite Seu Maciel entrou em prantos no boteco do Seu Jadir, dizendo que a mulatinha foi embora sem se despedir, Seu Jadir pediu calma e deu seu melhor conhaque pro velho, que bebeu até mijar e cagar na roupa, só não caiu porque foi carregado pra dentro por Seu Jadir.

Na noite anterior, na mesma que Zacarias saiu do boteco cuspindo fogo, a imprensa e os curiosos se anteciparam à polícia pra contemplar mais um cadáver de uma jovem decaptada com as vísceras espalhadas pela calçada.

Um comentário:

Unknown disse...

Oi Dé!
Passei por aki ligeiro!!pra te prestigiar, depois venho com calma pra ler seus texto
Bjs, poeta!!
Rosinha